Alzheimer/Velhice
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segunda-feira, 2 de dezembro de 2019
O centro
Quem me conhece sabe da paixão que tenho pelo centro. Percorrer aquelas ruelas é minha terapia de todo dia. Meu corpo anda automaticamente pelos caminhos tantas vezes percorridos e meu coração saltita todas as repetidas vezes, como se fosse a primeira vez. Conheço cada detalhe, cada cheiro e cada rosto dos que, como eu, também costumam andar ali. Tenho particular amor pela Conselheiro Mafra. É o meu encanto.
Por ali flano como se estivesse na minha própria casa e sei de todos os personagens que fazem daquela rua seu lar, os quais cumprimento com um sorriso, ainda que só eventualmente tenhamos nos falado: as prostitutas, os vendedores haitianos, os equatorianos, os africanos, as senhoras que vendem panos de prato, as que vendem meia, os que vendem agulha pra fogão à gás, os que consertam relógio, os que afiam tesoura, os vendedores de pipoca, os vendedores de água de coco, de caldo de cana. Minha família estendida.
Outra rua que me enternece é a Francisco Tolentino. Gosto de andar por ela nas tardes de calor entrando naquelas lojinhas de maravilhas que vendem toda a sorte de coisas, bem como nas lojas de roupa barata e as de calçado ruim. Posso ficar por horas escolhendo parafusos, ou peças estranhas de fogão, ou pegadores de armários, ou saias indianas falsificadas, ou bichinhos de pelúcia. E, antes de ir embora, tomar um cafezinho nas lanchonetes mocozadas com cheiro de fritura.
O centro é pura vida! Sem ele não existo. Se um dia eu morrer, e vou, com certeza minha alma errante ficará saracoteado por ali, como a do Mosquito (Hamilton Alexandre), o qual vejo sempre nas imediações do mercado público. Hoje mesmo o vi, rápido, com o computador na mão, passando ligeiro na Jerônimo Coelho. Olhamos um para o outro, almas irmãs, sorrimos, nos abraçamos longamente e seguimos, mergulhados na nossa paixão por essa cidade.
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