Ali estávamos, técnicos e estudantes, na vigília contra o
atraso. Nosso Centro, o de Ciências Econômicas, estava para votar o fim do voto
paritário. Um retrocesso que viabiliza o domínio completo dos professores nas
consultas eletivas. A desqualificação total dos trabalhadores técnicos e dos
estudantes. Coisa do tempo das trevas.
Durante dias os estudantes haviam mobilizado seus pares, bem
como os técnicos. E naquela sexta-feira, estavam ali os de luta, os de sempre,
os que não se acovardam. Dentro da sala rolava o debate, no segredo. Os professores
não permitiram a entrada dos manifestantes. Então, o povo aguardava, do lado de
fora, esperando pela hora da votação.
Foi então que vivemos um momento estelar. Essas frações de
segundos que valem uma vida. Esses momentos de profunda emoção que nos fazem
humanos de verdade. Vindo, devagarinho, no final do corredor, assoma o Danilo.
Ele não é estudante, nem técnico, nem professor concursado. Mas é mestre.
Militante do movimento Tortura Nunca Mais, ele foi um
guerreiro contra a ditadura. Participou da luta armada, esteve no Araguaia, foi
preso, torturado, teve seu corpo marcado para sempre e até hoje sofre as
consequências da maldade humana concretizada no ato da tortura. Mas, é um homem
que não desiste. Seu conselho diário é: “estudem, estudem e estudem!”
E isso é coisa que ele faz. Lê oito horas por dia, paciente
e sistemático. Por volta das três horas da tarde chega ao Iela, de onde sai só
lá pelas dez da noite. Pesquisa, conversa, ensina. Em volta dele juntam-se os
estudantes e o ouvem, embevecidos e reverentes. É amado e respeitado como um
mestre. Não precisa usurpar 70%, para ganhar a atenção e a consideração dos
estudantes e dos trabalhadores. Ele se faz imprescindível por sua prática, seu
exemplo. É amado como guru.
Por isso, aquele momento, no dia da votação, foi estelar.
Porque quando ele assomou no final do corredor, caminhando lento e seguro na
direção dos estudantes, a reação foi imediata. A atenção que estava voltada
para a sala onde os “professores” decidiam de maneira antidemocrática sobre a
vida de todos, virou-se para Danilo. Todos pararam de conversar, o violão
emudeceu, e principiaram as palmas. De mansinho, em meio o frenético bater de mãos, todos
começaram a gritar: Danilo, Danilo, Danilo...
E ele foi se chegando, com um riso tímido diante da
reverência, misturando-se ao movimento, fazendo-se gota no rio. Com sempre faz,
de mãos dadas com a maioria, com a justiça, com a luta. Mesmo na derrota –
porque é claro que fomos derrotados – é bonito demais viver coisas assim.
Danilo é mestre, e nem precisa de diploma...
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