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quarta-feira, 8 de junho de 2016

EBC - sobre fatos, boatos, versões e interesses



Por Jonas Valente - candidato da Chapa 2 à FENAJ
Está difícil lidar com a quantidade de erros, confusões (intencionais ou não) e ma fé quando o tema é a EBC. O reducionismo a serviço da disputa política e falta de compreensão do que é a comunicação pública (não na cabeça de alguém, mas na Constituição e na Lei 11652/2008) imperam, seja qual for a coloração política. Trato abaixo das últimas polêmicas, que vão da destituição do diretor-presidente à entrevista da Dilma.
Vai aí um texto para quem está a fim de entender e debater, e não ficar só repetindo boato.
A EBC foi criada pela Lei 11.652, que regulamentou o sistema público previsto na Constituição Federal (Art. 223). Ele se diferencia dos sistemas estatal e privado por buscar atender aos anseios da população e ter espaços de participação direto desta, como o Conselho Curador e a Ouvidoria. A empresa não é só a TV Brasil, mas controla 8 rádios, uma Agência, um Portal e uma Radioagência. Ela deve fazer comunicação plural e diversa com autonomia em relação a mercados e governos. A EBC é sim um marco pois antes dela o que tínhamos era comunicação governamental e uma tentativa de comunicação pública com a TV Cultura de São Paulo.
Depois de fazer um mestrado sobre a criação da EBC, fui trabalhar na TV Brasil. E descobri que os trabalhadores são elemento central para a garantia da autonomia da empresa, pois eles vivem o dia-a-dia dela. Mas não o fazem sozinhos. A dupla empregados-sociedade civil é o que consegue efetivar na prática a fiscalização para que os veículos da EBC não desviem de sua missão. É sim papel da EBC dar voz a quem não aparece na mídia, mas isso não significa adotar uma visão ou abandonar o equilíbrio. Sou de esquerda e tenho minha visão pessoal clara de que houve um golpe de Estado, mas isso não faz com que ache que a comunicação pública tenha que expressar a minha visão, ou a de quem está no Palácio do Planalto no momento.
Dito isso, é preciso se desvencilhar de dois mitos que pra mim só prejudicam a sobrevivência do projeto. O primeiro é que é uma "TV Chapa branca" (como disse o Estadão e como usa o governo interino para justificar o ataque à Lei da empresa). Tem sim problemas e temos questionado eles diuturnamente. Mas reduzir os veículos da EBC a isso é um equívoco. Se faz muita comunicação pública de qualidade ali sim, muitos colegas dão o sangue para fazer conteúdos que tratam de questões que passam longe da grande mídia. Outro mito é o que a EBC tem que ser o contraponto à mídia hegemônica com um discurso pró-Dilma. Não, não tem que ser. Ela pode sim problematizar diversos aspectos da conjuntura política fazendo bom jornalismo. Se for tratada como propaganda de governo ou partido, não sobrevive. O ponto de equilíbrio deve ser buscado na dupla "trabalhadores-sociedade civil".
A sociedade civil atua na empresa por meio do Conselho Curador, que não é um "aparelho do PT", como a gestão Temer quer fazer crer. Os trabalhadores são representados por seis sindicatos (jornalistas e radialistas do DF, SP e RJ) e uma comissão de empregados. Nem sempre as posições são unitárias mas tentamos atuar conjuntamente na medida do possível. Buscamos sempre realizar assembleias e plenárias para definir as ações e posições. Os trabalhadores da EBC expressam a diversidade que temos na sociedade brasileira. Então existem várias posições acerca do impeachment, da gestão anterior e da gestão interina. Mas o que se conseguiu nos últimos anos, na minha opinião, foi avançar para uma defesa do fortalecimento da comunicação pública que passa tanto pelas questões das condições de trabalho quanto pela esfera editorial.
Essa defesa da comunicação pública tem feito com que os trabalhadores, já há vários anos, protagonizem enfrentamentos com direções da EBC. Isso vem desde a gestão Tereza Cruvinel e se intensificou nas gestões Breve e do Américo. Fizemos duas greves, em 2013 e 2015, e uma paralisação em 2014. Em todas elas a pauta não era somente econômica, com debates sobre como fortalecer a autonomia da empresa e valorizar seu lado público, separando-o claramente do estatal. Na greve de 2015 a pauta central foi a crítica às chefias indicadas politicamente, denunciando o "cabideiro" imposto pela Secom à época. Uma conquista central da greve foi a obrigação da ocupação de 70% dos cargos de livre provimento por empregados da casa. Consideramos que isso é fundamental para assegurar a autonomia citada.
Quando da destituição de Ricardo Melo, foi realizada uma plenária na qual foi aprovado documento que defendia a lei da EBC e o mandato como um dos mecanismos de garantia de autonomia, assim como o Conselho Curador. Faço questão de destacar: não se trata de defender a gestão Melo ou qualquer que seja. Se houver um novo mandato indicado por quem quer que seja defenderemos o instituto do mandato. Infelizmente isso tem sido usado por alguns para tentar colar uma pecha de entidades "aliadas" de Melo. O texto do Andrei Meirelles, do site Os Divergentes, é um exemplo.
Assim como criticamos o cabideiro da gestão Edinho, já houve críticas ao governo interino. Os trabalhadores aprovaram carta à Secom de Temer contrários à MP, ao desmonte da comunicação pública, à fusão entre a NBR e a TV Brasil, à redução da estrutura dos veículos, em defesa do Conselho Curador e do projeto da comunicação pública (entre pautas mais próprias como plano de carreiras e ocupação de cargos de chefia por pessoas da casa com processo de seleção interna). Este desmonte em minha opinião é algo grave que deve ser objeto de preocupação da sociedade. Foi por conta dele que foi criada a Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública.
E assim como fizemos essas críticas, em reunião realizada entre as representações e Ricardo Melo criticamos a entrevista da Dilma feita por Luís Nassif. Consideramos sim que entrevistar a presidente afastada é jornalisticamente importante. Mas isso deve se dar em um processo de entrevistas de outras lideranças e consideramos que deveria ser feito por jornalistas do quadro.
Essa crítica tem por trás uma problematização que fazemos dos contratos milionários de pessoas na casa (como o do próprio Nassif) e passou também pelo argumento de que o contrato dele estava suspenso. O presidente falou que isso seria feito com algum tipo de cessão ou colaboração. Nós questionamos como, pois não estava claro e a entrevista ser feita por alguém de fora, mesmo que fosse contratado até dias atrás, seria ruim. Portanto, não houve "censura" ou "veto". Mas houve sim críticas e cobranças quanto a ela. A decisão de por que vai ou não levar ao ar é da direção da empresa. O que não aceito é tentar usar as entidades de trabalhadores como bode expiatório, seja de que lado for. Nosso compromisso é com a comunicação pública. Ela não é de ninguém, mas "de todo mundo". E ser de todo mundo em uma sociedade democrática não é uma equação fácil, exige mecanismos complexos de participação e equalização das divergências. Esperamos que o projeto da comunicação pública não sucumba frente à radicalização política e aos interesses de miná-lo.

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