Alzheimer/Velhice

sexta-feira, 10 de março de 2023

Tô gostando desse mundo não



A vida anda muito estressante para quem é da minha geração. Esse mundo tecnológico, no qual tudo tem de ser feito pela internet, toma tempo demais da gente, quando não enlouquece a pessoa totalmente. Ontem fui ao centro comprar um computador, porque o da rádio Campeche deu tilti total. Precisava dele para ontem mesmo, para colocar a rádio no ar. Andei em várias lojas no centro e os computadores de melhor preço não estavam disponíveis. Só se a compra fosse feita pelo aplicativo da loja. Tem base isso? Tô na loja, mas tem de ser feito pelo aplicativo. Mas, o caso é que fazendo pela internet o prazo de entrega é outro. Só na semana que vem porque, na verdade, não é a loja que vende, e sim um parceiro da loja. Sabe-se lá que loucura essa. Resultado: mais um sangramento de úlcera, de tanto ódio acumulado. Perdi tempo, estressei e voltei sem o equipamento. 

Outro universo cabeludo são os bancos. Precisava de uma assinatura digital para um documento. Tinha de ser feito no gov.com. Tudo na internet. Lá, só pode fazer assinatura quem tem conta prata. E para ter conta prata tem de fazer alguma transação no banco da pessoa. Faz vinte vezes o processo e dá erro. Entra na página do banco e para subir de nível na conta tem de cadastrar um determinado documento. Ok, vamos lá então. Faz todo o procedimento e dá erro, dizendo que isso não pode ser feito pela internet, só na agência. Mas, aí, não dá prazo de ir numa agência. Olha, é dureza de entender. Faz uma parte pela internet e outra pelo presencial. Que porra é essa?  Todo dia tem um lance assim, uma perda de tempo do caralho preenchendo formulários, senhas e não sei que mais. Pra no final ainda dar erro. Mais um sangramento de úlcera. O vivente não tem como fugir. 

Pessoas mais velhas que não nasceram já com um celular na mão sofrem demais nesse mundo. É incrível. Aquelas que não têm ninguém para ajudar estão literalmente ferradas e se buscam ajuda nos Bancos, por exemplo, são mal tratadas, vistas como estúpidas. É um inferno. Dias há que a gente acorda com um azar tremendo e tudo vai dando errado, encordoadinho, até que vem a explosão. 

Acho que prefiro o mundo zumbi, que a gente vai encontrando os monstros e passando o facão, tudo na brutalidade da vida, cara-a-cara. Esse mundo internético? Gosto não. Ô ódio, viu...

quarta-feira, 8 de março de 2023

Recuperar a qualidade dos cursos de Graduação da UFSC: o grande desafio para 2023

 


Foto: Henrique Almeida

Carta aberta do professor Lauro Mattei sobre a necessidade de uma profunda análise da situação da graduação na UFSC depois de todo o drama da pandemia que esvaziou os cursos e gerou outra série de grande problemas para os estudantes. 


Texto do professor Lauro Mattei

O início do ano de 2020 demarcou uma nova era na história da humanidade, uma vez que a pandemia provocada pelo novo coronavírus atingiu todos os países e povos do mundo, causando milhões de mortes, além de deixar um número expressivo de sequelados e de milhares de crianças órfãs. No Brasil o primeiro caso da doença (Covid-19) foi oficialmente registrado em 26.02.2020, sendo que a virose logo se espalhou por todas as cidades e regiões do país. Já em Santa Catarina (SC), o primeiro registro oficial da doença foi documentado em 12.03.2020.

Como naquele momento (ano de 2020) não havia um antídoto eficaz para combater a doença, os mecanismos de proteção das pessoas foram o isolamento social e o uso de máscaras para evitar o contágio, uma vez que a transmissão ocorria via micropartículas virais expelidas pelo sistema respiratório.

Neste cenário, a UFSC decretou, em 15.03.2020, a suspensão de todas as atividades acadêmicas e administrativas presenciais. Todavia, somente após cinco meses – e diante da continuidade e avanço da pandemia – foi instituído o ensino remoto, o qual perdurou até o mês de março/22, período que compreendeu os dois semestres letivos dos anos de 2020 e de 2021. Obviamente que esse foi um período extremamente complexo, dada a gravidade com que a pandemia se alastrou no país e também em SC, afetando as diversas esferas da vida de todos.

Infelizmente, até hoje a UFSC não fez uma avaliação rigorosa e adequada sobre o significado desse processo sobre os resultados do ensino remoto, especialmente na aprendizagem do corpo discente. Ou seja, no dia 15.03.2020 tiramos o plug da tomada e no dia 18.04.2022 o recolocamos, seguindo as rotinas acadêmicas e administrativas como se nada tivesse ocorrido. Mas o retorno às aulas presenciais revelou – pelo menos para aqueles que querem ver e analisar um conjunto enorme de problemas, inclusive que se avolumaram após um ano de ensino presencial. O mais evidente desses problemas é o enorme número de vagas ociosas nos cursos de todas as unidades de ensino da universidade. Mas há, ainda, uma quantidade enorme de problemas bem menos visíveis, quase sempre ligados aos aspectos comportamentais e existenciais dos integrantes da comunidade universitária.

Neste caso, gostaria de registrar o feede back que obtive de um número considerável de estudantes ao longo do ano de 2022. Assim, problemas de ansiedade, desânimo, falta de concentração, desistência, depressão, etc., são bem mais comuns do que se possa imaginar. E o resultado da combinação dessas diversas mazelas afetou e ainda está afetando a qualidade do processo ensino-aprendizagem, caso nada seja feito para o enfrentamento das mesmas.

Exatamente neste ponto, gostaria de externar duas ordens de preocupação. A primeira delas diz respeito ao comportamento de parte expressiva do corpo docente que, de maneira confortável e até mesmo descompromissada, faz de conta que esses problemas não existem e seguem como se a vida acadêmica-profissional continuasse como era antes do início da pandemia, porém com um agravante: tornou-se comum para uma parte importante da categoria docente a narrativa de que fazer reuniões presenciais para discutir os problemas anteriormente mencionados é “perda de tempo”. Registre-se que há relatos de que muitas atividades acadêmicas da graduação em diversas unidades continuam remotamente, apesar da decisão da instância máxima da universidade (CUn) de que essas atividades devem ser 100% presenciais. Assim, cada qual continua em seu “quintalzinho” enquanto “la nave va”.

A segunda diz respeito à postura das administrações da UFSC. A gestão anterior – encerrada em junho de 2022 – foi marcada por uma inércia monumental desde o início da pandemia, destacando-se a lentidão para implementar o ensino remoto quando este já era um ponto pacífico na maioria dos países igualmente afetados pela pandemia. Além disso, entre março de 2020 e junho/22 a UFSC viveu um período de completo abandono, cujo cenário era mostrado cotidianamente pelos meios de comunicação, uma vez que o mato tomou conta das diversas edificações, especialmente no campus de Florianópolis. Já a gestão atual – empossada no início de julho/22, portanto há oito meses – ainda não foi capaz de tomar iniciativas robustas voltadas a atacar os problemas anteriormente mencionados, particularmente em termos da elaboração de um diagnóstico preciso sobre os impactos da Covid-19 na esfera da graduação, apesar de ter sido eleita com o discurso de que sua prioridade seria o ensino de graduação.

Em meados de janeiro/23 mantive uma reunião reservada com o atual Reitor, momento em que explicitei todos os problemas acadêmicos que observei a partir do retorno do ensino presencial após dois anos de ensino remoto, ao mesmo tempo em que fiz uma sugestão geral que se desdobrava em duas dimensões para se pensar o início das atividades do ano letivo de 2023: a primeira dizia respeito à organização de uma força tarefa por parte dos integrantes da gestão atual para, no período entre 15.01 a 28.02.23, fazer um diagnóstico mínimo sobre a situação de cada curso de todas as unidades acadêmicas segundo os principais indicadores (índice de aproveitamentos, índice de reprovação, índice de represamento, abandonos, desistências, etc.) que ajudam a compreender a realidade atual; a segunda, partindo desse primeiro passo, seria organizar nas primeiras três semanas do calendário de atividades (mês de março) ações conjuntas em cada curso envolvendo todos os segmentos com o objetivo de discutir minimamente a realidade e os desafios a serem enfrentados visando melhorar a qualidade dos cursos de graduação em cada área de conhecimento.

Minha surpresa for ver no dia 03.03.23 a página principal da UFSC divulgar a programação de retorno às atividades acadêmicas para praticamente todo o mês de março/23, da qual faz parte um conjunto de atividades que vão desde oficinas diversas, cursos de cálculo e estatística, recepção aos calouros de alguns cursos, além de diversas atividades específicas correlacionadas aos assuntos identitários e de gênero. Diante disso, minha reação foi enviar, as 11:15h do mesmo dia, uma mensagem ao Reitor, cujo teor segue: “estou aqui vendo a programação de início das aulas do ano de 2023. De fato, a programação é extensa e variada. Todavia, passa longe de enfrentar os reais problemas da graduação conforme comentei contigo em nossa conversa no início de janeiro/23”.

Minha segunda surpresa veio no mesmo dia: ao acessar novamente a mesma página da UFSC percebi que tal programação não estava mais disponível. Continuo crendo que a atual administração tem feito poucos esforços para enfrentar as questões centrais da graduação, apesar de reconhecer a importância de outras pautas também relevantes que serão desenvolvidas.