Fotos: Rosane Talayer de Lima
Canções, palavras de ordem, bandeiras e pessoas em luta rasgaram a manhã nublada da capital catarinense na manhã de segunda feira (24.10). Eram os representantes das mais de 600 famílias que hoje estão batalhando pelo seu direito de morar, lutando contra o despejo. A ameaça está sob a cabeça porque as comunidades nas quais moram são consideradas ilegais pelo poder público, ainda que algumas delas existam há mais de 20 anos. A verdade mesmo é que elas ocupam espaços que hoje estão sob a cobiça da especulação imobiliária que tudo o que quer é “tirar os pobres da sala”. Não bastasse isso, em Palhoça, por exemplo, a prefeitura define obras que atravessam comunidades sem a realização de audiências públicas, sem ouvir as famílias, sem diálogo e ainda ferindo a lei ambiental.
A marcha pela Moradia contra o Despejo começou no estreito, bairro continental de Florianópolis e veio em direção à ilha, passando pela ponte Hercílio Luz, o cartão de visitas da capital. Desde 1986 que a “velha senhora” não via a marca de uma manifestação popular - no campo da moradia - sob suas vigas. Foi bonito de ver a mistura das cores das bandeiras com o céu azul e o cinza brilhante da ponte. O espaço, que desde sua re-inauguração tem servido de cenário para fotos e visitas turísticas, sentiu a vibração das famílias locais, as que vivem e sofrem a cidade real, trabalhadores e trabalhadoras que muitas vezes não tem sequer o dinheiro da passagem para uma visita aos domingos com a família. Por isso, em meio à luta, foi com alegria que as famílias cruzaram o caminho, com crianças, velhos e jovens vivendo esse momento pela primeira vez.
A reivindicação principal da marcha é a manutenção da ADPF 828, uma normativa que proíbe despejos na pandemia e que tem seu prazo de validade até o dia 30 deste mês. Na semana passada os movimentos que estão na luta junto com as comunidades já realizaram uma visita à Assembleia Legislativa, onde arrancaram uma Audiência Pública sobre o tema, que vai acontecer no dia 8 de novembro. O foco mais urgente são as ações de despejo e o projeto da Avenida Beira-Rio em Palhoça, que deverá atingir imediatamente 300 famílias das comunidades Benjamin e Fé em Deus. Mas, outras comunidades também estão ameaçadas.
A intenção do movimento foi justamente ocupar o “cartão postal” da cidade para chamar a atenção das autoridades acerca da questão da moradia, visto que na capital, por exemplo, há anos que inexiste qualquer projeto de construção de moradias populares, tema que também é pouco discutido nos demais municípios da região metropolitana. E é justamente por isso que não resta alternativa às famílias que não conseguem pagar os altos aluguéis, a não ser ocupar terrenos vazios que não cumprem com sua função social.
A caminhada atravessou o Estreito, cruzou a ponte e seguiu para o centro de Florianópolis. Além da movimentação na rua, para dar visibilidade ao momento de luta, foram entregues documentos referentes à Campanha Despejo Zero no Ministério Público Estadual e Federal, nas prefeituras dos municípios da região e da capital, no Tribunal de Justiça e também aos representantes da Diocese da Igreja Matriz, onde a marcha descansou. Na fala do padre Vilson Groh, ficou o compromisso de levar para as paróquias o debate sobre o tema da moradia. O mesmo documento deverá ser entregue aos candidatos a governador e presidência da República, já que o tema moradia não aparece nas campanhas.
Estiveram presentes famílias das ocupações Vale das Palmeiras, Contestado, Anita Garibaldi, Marielle Franco, Vila Esperança, Benjamin, Fé em Deus, Beira Rio, Mestre Moa, Carlos Marighella, Fabiano de Cristo, Vila Aparecida e Elza Soares. Uma coluna com adultos, velhos e crianças, que sabem muito bem que só a luta garante direitos à classe trabalhadora e que, por isso mesmo, não se furta ao corajoso ato de reivindicar. Foi assim para encontrar um espaço onde erguer a casa, foi assim para construir as moradias sem apoio algum, e é assim que se unem para defender um direito que é de todos os brasileiros: morar com dignidade.
O dia 30 de outubro, além de marcar as eleições, será um momento de tensão para as famílias que vivem a ameaça de despejo. E isso não é coisa só do nosso entorno, é em todo o país, pois com o fim do prazo para o despejo zero, muitas ações deverão acontecer no sentido de tirar as famílias de sua morada. Por isso esse movimento precisa estar de pé.
A luta segue e se fará presente outra vez na Alesc, dia 08 de novembro.
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