No geral, sou otimista. Mas, desde que a cultura da morte tomou o país, tenho andado ajujada de dores. Elas respingam todas as possibilidades de alegria e, imiscuídas na existência, se destacam absurdamente. No campo pessoal tenho visto meu pai caminhar devagarito para o grande começo. Não é coisa fácil. E esse ano de 2020 foi particularmente duro. Cada pessoa que tomba, anonimamente, por conta do plano perverso desse governo, é como uma chaga aberta no meu próprio corpo. Sim, no capitalismo, as coisas são assim mesmo, o tempo todo. Os trabalhadores caindo como moscas para enriquecer meia dúzia. Mas, com a pandemia, fica tudo ampliado demais. Por isso invejo quem dorme.
Minhas noites não são calmas. Elas se preenchem com o cuidado do pai e o pensamento na dor dos que vão perdendo seus amados por pura negligência. Tá osso. Sim, todo mundo vai morrer. Mas, não precisava ser por falta de um respirador, ou de uma UTI. A morte tinha de ser como a de Antônia, a do filme, que realiza tudo o que precisa realizar, deita e parte.
Esta noite não vou dançar, nem cantar, nem celebrar. Tampouco enviarei votos de esperança ou de gratidão. Não. Na solidão, buscarei e afiarei as adagas, sistemática e lentamente. Porque haverá de chegar o momento - coletivamente - de rasgar essa noite escura. Haverá de chegar... E que seja logo!
Porque esse sim será o grande recomeço, o tempo novo.