Frente Parlamentar será presidida por Dirceu Dresch |
Raul Fitipaldi, do Desacato, é um dos articuladores |
A Assembleia Legislativa de Santa Catarina lançou nessa
terça-feira, dia 14 de agosto, a Frente Parlamentar pela Democratização da
Comunicação, sob a coordenação do deputado Dirceu Dresch (PT). Essa frente foi uma
proposição que surgiu da articulação de vários meios de comunicação
independentes, livres e comunitários, puxados pelo Portal Desacato, preocupados em discutir de maneira mais
sistemática a questão do monopólio da informação, bem como o monopólio das
verbas públicas.
É sabido que a mídia no Brasil está sob o domínio de poucas
famílias e uma igreja, todos atuando conforme os interesses da classe
dominante. Nessas empresas de comunicação que produzem praticamente tudo o que
se vê, lê e ouve, o espaço para o contraditório é praticamente inexistente. As
lutas dos trabalhadores, os grandes problemas nacionais, a crítica sistemática
que deveria ser a característica do jornalismo, tudo isso fica ausente. Resta a
grupos independentes de jornalistas ou comunicadores sociais, mostrar o outro
lado das notícias, praticando efetivamente o jornalismo.
Mas, esses veículos independentes ou comunitários no geral estão fadados a ineficácia, uma vez
que enfrentam muitas dificuldades para garantir estrutura e para produzir a
informação de qualidade. Como bem disse a presidenta da Cooperativa Desacato,
Rosângela Bion de Assis, é bem capaz que uma cooperativa pague mais
imposto do que uma rede como a Globo, sempre aliada do poder. Só em 2002, por
conta da Copa do Mundo, a emissora dos Marinho sonegou 358 milhões em impostos.
Isso foi divulgado com exclusividade pelo jornalista Miguel do Rosário, a
partir de um documento oficial da Receita Federal, o Termo de Verificação e de
Constatação Fiscal, datado de 25 de julho de 2006 e assinado pelo auditor
Alberto Sodré Zile.
Isso diz respeito apenas a 2007. Agora imaginem se uma rádio
comunitária deixar de pagar algum imposto? O que aconteceria com ela? Com
certeza, fecharia.
E é assim que as grandes empresas de comunicação vão
acumulando capital, sempre de mãos dadas com os governos de plantão, servindo
aos interesses de quem domina o sistema de produção. Por isso, o monopólio. Aos
governos é importante ter essas empresas sob seu cabresto, e às empresas é bom
poder ganhar dinheiro à larga. “Quid pro quo”, a boa e velha troca de favores.
Nesse universo da comunicação há pouquíssimo espaço para a
comunicação da classe trabalhadora, ou seja, da maioria da população. Nessas
empresas a notícia que interessa a essa classe não tem vez. Sendo assim, é
preciso atuar na margem. Foram assim que surgiram os jornais sindicais,
buscando chegar ao trabalhador. E, depois, os jornais partidários, também
procurando encontrar um caminho por onde a informação não hegemônica pudesse se
expressar. E tudo isso sempre foi feito a partir da arrecadação vinda dos
próprios trabalhadores. Uma batalha desigual, visto que os trabalhadores não conseguem
manter veículos de massa com abrangência nacional. Afinal, só a Rede Globo é
dona do melhor sinal de televisão do país, chegando aos confins das terras,
abrangendo quase 97% do território nacional. Como competir?
As novas tecnologias, com a assunção da rede mundial de
computadores, ofereceu um novo espaço para as mídias independentes, que
começaram a criar suas páginas e a usar as redes sociais. Mas, essa é uma
realidade enganosa, visto que o controle da rede não é dos próprios veículos. Também
é preciso pagar para usar a www, e pagar caro. Além disso a “rede” tem um dono
e esse dono pode tirar do ar a qualquer momento qualquer página de notícias que
não esteja adequada aos seus interesses. Sendo assim, os meios comunitários,
independentes, sindicais ou populares seguem refém dos donos do capital.
Recentemente comemorou-se no Brasil o fato de a rede social
de Mark Zuckberg ter tirado do ar vários sítios da extrema-direita, basicamente
formado por notícias falsas. Mas, o pau que bate em Chico, bate em Francisco
também. Nessa semana a mesma rede excluiu páginas da Telesur e de outras
agências de notícias sobre a Venezuela que produziam em inglês. Não tinham
notícias falsas, mas informações sobre a Venezuela que o governo de Donal Trump
não quer que seus compatriotas saibam. Assim, qualquer coisa que não interesse
ao capital, é eliminada, sem dó nem piedade. Isso significa que a tal “democracia” da internet segue o mesmo diapasão da
democracia política que existe no capitalismo. Só é respeitado o que serve ao
poder e o que não incomoda muito.
É esse debate que as entidades sociais e os veículos anticapitalistas
e anti-hegemônicos querem fazer dentro da Frente Parlamentar. Colocar à nu a
realidade monopólica da comunicação, que existe também em nível estadual. Em
Santa Catarina, por exemplo, uma única empresa domina emissoras de televisão e
jornais em praticamente todas as regiões. O espaço para o jornalismo é
absolutamente reduzido aos pequenos veículos, que não conseguem o alcance e a
eficácia dessa única rede.
Não bastasse isso, são essas poucas empresas que abocanham
todos os recursos do estado destinado à mídia. A verba, que gira em torno dos
100 milhões de reais, é centralizada sempre nos mesmos meios e distribuída pela
mesma empresa de publicidade há anos. Esse ano, finalmente, depois e muitas
denuncias e pedidos de explicação, o governo do estado abriu licitação para
contração de nova empresa, ou empresas, para gerir as verbas. A entrega de
propostas está marcada para setembro. Ainda assim, certamente a distribuição seguirá sendo
a mesma, sempre nos mesmos grupos. Nada para as mídias menores. É nesse campo que a Frente pretende atuar.
A intenção dos comunicadores e jornalistas que provocaram a formação
da Frente Parlamentar é agora pressionar desde dentro da casa das leis para que
haja mais equidade na distribuição das verbas públicas. Santa Catarina tem mais
de cem rádios comunitárias e dezenas de grupos comunicacionais menores que
também têm direito a receber verbas públicas. Debates públicos e pressão interna na AL devem
ser os pontos de luta.
É fato que no modo capitalista a tal da “democracia” sempre
será capenga, mas para que venha outra forma de organizar a vida e para que a
comunicação seja realmente soberana é preciso lutar aqui e agora, avançando no
que for possível dentro do sistema, sem perder o foco na batalha mais
importante que é a de destruir esse modo de produção. É a caminhada histórica das gentes em luta que muda a vida.
Enquanto isso cabe a mídia independente, comunitária e
popular seguir produzindo jornalismo, de verdade, atuando como criadora de conhecimento,
provocando o pensamento crítico.